28.10.07

Conde Redondo Feliz - d'après Cem Anos de Solidão

«Setenta e um anos, três meses e dezassete dias depois, diante de uma imperial e um pratinho de tremoços, o velho praça Rolando Bonifácio Mealha havia de recordar aquela tarde remota em que o seu pai o levou às putas da Luciano Cordeiro.»
(Anónimo)


The Road

Não sei se foi essa a intenção, mas a ideia que mais me tem ocorrido durante a leitura de The Shape of Things to Come, o último livro de Greil Marcus, é a ideia de "estrada" como um daqueles elementos essenciais de que é feita a argamassa que une a cultura americana. A América, que começa por ser um país assente em proclamações, declarações e discursos, regressa sempre, de uma maneira ou de outra, à estrada - ou, num sentido mais naturalista, ao caminho. Marcus fala dos inadaptados: da personagem de Henry Fonda em As Vinhas da Ira; de Jack Bauer, suposto morto, a caminhar com a mochila às costas no final de uma das séries de 24, qual John Wayne pós-11 de Setembro; do homem descrito por John dos Passos no início de U.S.A.: "no job, no woman, no house, no city". E mais à frente fala também de Lost Highway, da última cena, com Bill Pulman estrada fora, a alta velocidade, como se todos os medos do mundo o perseguissem. E perde-se a descrever com detalhe o traço descontínuo da auto-estrada e o que este quererá significar. E podia ainda falar do On the Road, de Kerouac. Ou de On the Road Again, um outro sinónimo para a "república invisivel". Ou em The Road, de Cormac McCarthy, onde a estrada é uma vez mais a casa dos que não têm casa. Nos grandes países, a geografia é determinante. E nela entram a estrada, o caminho, os infindáveis caminhos que acabam sempre por bifurcar e se cruzar, as encruzilhadas onde o destino hesita e se decide.




Pipeline (No. 54), 1973

Palos Verdes Cove, February 22, 1964

O surf é um desporto, mas é também uma cultura dentro da cultura americana. E LeRoy Grannis é o seu Walker Evans. Sem querer ser desconstrutivista, algumas das fotografias que tirou no período de ouro dos anos 60 e 70 merecem o melhor dos museus de arte moderna. Aqui, mais do que a estética (sublime), é o escapismo quem mais ordena.

23.10.07


Como bem lembrou um amigo: não há conversa de engate mais infalível que a que versa sobre os livros de Julian Cope. Depois de Krautrocksampler, temos Japrocksampler. Aconselhável com asiáticas, gémeas polacas, tulipas e chaminés.

21.10.07

16.10.07

Do vídeo amadorismo:

Reparo que naqueles irritantes filmes de retrospectiva de vida, que agora nos impingem em festas de anos e outras, os ex-maridos e as ex-mulheres são literalmente apagados. Quem diria que, com "o fim da História", o camarada José Estaline iria acabar como uma incontornável referência do biopic artesanal.

15.10.07

Amabutho hoofsaaklik

Não há nada mais distante do Apartheid (a começar pelo próprio Estado Sul Africano, só que agora ao contrário, com o tolerado slogan "Kill the Boer, kill the farmer") que os actuais Springboks. Lado a lado com Brian Habana e J P Pieterson competem vários membros da família Botha, os irmãos Jannie e Bismark (sic) du Plessis, e gente com nomes como Johannes Muller, Andre Pretorius, Os du Randt, Schalk Burger ou Christoffel Johannes van der Linde.

Patriotic music

"I remember that the music in Deep Throat was campy and adorable. Porn films always had that boom-chicka-boom-chicka-boom music, bur Gerard Damiano (the director) always had the desire to go straight, so he put in music that was unlike typical porn music. Not just bouncy stuff, but more fun-goofy-crazy music. There's the scene where the guy orgasms in Linda's mouth. Rockets and explotions are blasting off, and they play all this patriotic music."

Ron Jeremy nas liner notes do LP Deep Throat I.

12.10.07

We're a happy family


Betty Davis e Miles ficam lindos lado a lado.

10.10.07

Lonesome and long bear club band


Nem que fosse pelo prazer da barba, valeria a pena formar um super-grupo de que fizessem parte Devandra Banhart, Kawabata Makoto (o guru do Acid Mother Temple), Will Oldham circa Master and Everyone, e o bom e velho marxista Robert Wyatt.

Um blog chabalista

Congresso do PSD - da série: expressões gatilho

Ou, intróitos para uma standing ovation

“... uma entusiasmante resposta das bases!”
“... dar a cara em tempos difíceis”
“... renascer a partir do poder local”
“... ao contrário de muitos intelectuais de salão”
“... a herança de Francisco Sá Carneiro”
“... Sá Carneiro”

Cinema chungamental

O cinema chunga (trash, exploitation, etc.) é o quarto de brinquedos dos cinéfilos. Tirando alguns académicos mais sisudos, todos acabam por lá se sentar de cócoras.

Deus, barbas, famílias

Um dos aspectos mais simpáticos e saudáveis do conservadorismo tradicional é a persistência no uso das palavras segundo o seu sentido comum. Por exemplo, Deus é Deus - uma Entidade, por vezes retratada com uma barba branca, em que se crê ou não crê. Não é a classe operária, nem o Estado, nem “o mercado”, nem um guerrilheiro latino-americano, nem aquela outra entidade, também barbuda, que em tempos escreveu um livro sobre a forma das coisas que haveriam de vir.

Love at first sight

O primeiro impacto é o impacto visual. Um homem vê uma mulher linda de morrer e logo a classifica, numa escala de um a dez, com a nota máxima em fisico-química sentimental. Depois, com sorte, vêm os gestos, as conversas, os encostos, outros olhares, outros impactos. Só que estes, na melhor das hipóteses, apenas lhe poderão garantir a manutenção da nota obtida.

Stranger than Paradise

Dois anos depois de Swordfishtrombones, o álbum (será “álbum”, para além de um arcaísmo, uma expressão a abater?) que marcou o início da fase pós-Hopper, Tom Waits gravou Rain Dogs. É o arquétipo do disco de “ilha deserta”. Extenso e multifacetado; capaz de suscitar reacções e sensações que vão do medo à euforia, da coolness à nostalgia e à vontade de chorar; com melodias insólitas, instrumentação desconcertante e, pelo menos, seis ou sete músicas do cânone Ocidental. Uma delas é este Jockey full of Burbon. Jim Jarmusch, patrono da casa, concorda comigo.